Revista Época – Fabíola quer casar assim como Luciana, Claudia e Orlando. Milhares de solteiros pagam até R$ 1.500 por um amor
ALEXANDRE MANSUR,
com fotos de MAURILO CLARETO
Nome
Fabíola Feres
Idade
29 anos
Profissão
Bióloga
Cadastrada desde
2002
Pagou
R$ 360,00
Total de encontros
Quatro
Parceiro ideal
Entre 28 e 40 anos
Charmoso e com mais de 1,70 metro
Culto, que goste de ler, freqüentar teatro e debater filmes intelectuais
Bem resolvido profissional e afetivamente. De preferência, sem filhos
Na comédia romântica Amores Possíveis, último filme da diretora Sandra Werneck, o personagem do ator Murilo Benício aparece numa agência matrimonial. Aos poucos, vai desfiando o que espera de uma parceira. ‘Eu quero uma mulher independente, mas que ao mesmo tempo seja absolutamente ligada ao parceiro. Não gosto de submissas, mas, por outro lado, ela tem de estar ciente de que seu papel no mundo é me fazer feliz’, desfia. Na hora de definir o tipo físico, é um pouco mais preciso. ‘Corpo trabalhado, mas também não gosto de músculos, não’, começa. ‘Peitos que caibam na palma da mão. Nem mais, nem menos. Lábios carnudos, que eu não gosto de boca fina. Pode ser uma barriguinha macia, apenas o suficiente para eu poder repousar minha cabecinha… Bom, acho que não sou muito exigente’, conclui. A encomenda provoca risos. ‘É um recurso de humor, porque ele pede um perfil idealizado demais’, explica Sandra Werneck.
Nas mais de 30 agências do mundo real espalhadas pelo país afora, o desfile de gente louca para casar acaba produzindo cenas muito semelhantes às dos filmes. A maioria dos clientes só procura esses serviços quando já driblou uma dose de preconceito e está convencida de que não há candidatos disponíveis por perto. Uma pesquisa do departamento de psicologia experimental da USP mostra que apenas um em cada cinco namoros começa em locais de lazer, como boates e bares. A maioria dos romances – 37% – ainda acontece em ambientes de estudo ou trabalho. ‘As agências são um caminho para conhecer pessoas confiáveis fora das rodas nas quais o cliente circula’, defende Harry Philipe, diretor da Paimi, no mercado há 54 anos. Ele mesmo casou, por obra da agência, com uma comissária da Vasp que nunca encontrou em um vôo.
Feios ou bonitos, jovens ou mais velhos, os candidatos acabam revelando sonhos e fragilidades diante dos psicólogos encarregados de traçar seu perfil. ‘Eu me senti incompetente quando me inscrevi na agência. E me perguntei: será que tenho necessidade disso? Mas queria um relacionamento sólido e as mulheres que conhecia não estavam levando nada muito a sério’, explica o técnico em telecomunicações Orlando Torres Solin, de 44 anos, divorciado há 11 anos. Em seus devaneios, Solin idealiza uma mulher nos mínimos detalhes. Alguns inusitados. ‘Que não seja parada, que não se encha de refrigerantes e não fique na frente da TV’, enumera.
Nome
José Fernando Roboton
Idade
55 anos
Profissão
Administrador de imóveis
Cadastrado desde
2002
Pagou
R$ 1.500,00
Total de encontros
Dois
Parceira ideal
De 38 a 46 anos
Atraente o suficiente para chamar atenção à primeira vista
Não pode fumar
Precisa ter formação universitária e cultura suficiente para manter uma conversa sofisticada
Na crônica de costumes dos solteiros, homens e mulheres costumam desejar coisas diferentes de um relacionamento. Quando concordam em pagar pelos serviços de uma agência, eles eliminam a maior de todas as discordâncias: todos ali querem casar. A maioria procura as agências quando percebe que investiu tanto na carreira que nem reparou nos pretendentes pelo caminho. ‘Eles só caem na real quando começam a ser chamados para os aniversários dos filhos dos amigos. Aí, querem casar o mais rápido possível’, afirma a psicóloga Gláucia Boaventura, coordenadora da Match Making, outra representante do ramo.
Os homens preferem mulheres que mostram disposição para equilibrar a vida profissional e afetiva. Na prática, o conceito é difícil de definir. ‘É justo a mulher querer independência, mas tem de haver um equilíbrio’, argumenta um analista de sistemas paulista de 41 anos. Ele conheceu há um ano e meio uma empresária com a ajuda de uma agência. Os dois namoraram e noivaram. Chegou a construir uma casa em Vinhedo, cidade com condomínios de luxo no interior paulista. Mas o casamento não saiu. ‘Ela tinha uma rede de lojas e não queria se dedicar nem um pouco à administração doméstica’, justifica. Acusado de machista, ele defende-se: ‘Não quero uma mulher que fique em casa, mas alguém flexível’.
As mulheres, em geral, pedem candidatos com perfil menos definido. Mas são mais difíceis de agradar. Uma pesquisa realizada pela revista americana Time e pela rede de televisão CNN revelou que 41% dos homens aceitariam se casar com uma mulher que não correspondesse a seu ideal. Mas apenas 34% das mulheres topariam o mesmo. ‘Talvez os homens convivam melhor com as imperfeições da companheira porque a relação amorosa não ocupa tanto espaço em sua vida. Eles também reservam prazer para o futebol ou o chopinho com os amigos’, supõe a antropóloga Mirian Goldenberg, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Nome
Helenice Mitsue Antunes
Idade
31 anos
Profissão
Artista plástica
Cadastrada desde
1999 até 2001
Pagou
R$ 150,00
Total de encontros
Quatro
Parceiro ideal
De mais de 30 anos, gentil, compreensivo e educado
Nome
Alexandre Antunes
Idade
32 anos
Profissão
Professor
Cadastrado desde
2000 até 2001
Pagou
R$ 300,00
Total de encontros
Dois
Parceira ideal
De 24 a 29 anos, com menos de 1,65 metro
Sem filhos, educada, simples. Que goste de natureza e do interior
Para aumentar as chances de sucesso, o desafio das agências é amenizar o desconforto do primeiro encontro. No sistema tradicional, o homem liga para a mulher, conversa brevemente por telefone e marca um jantar a dois. ‘Sugerimos que ele escolha um lugar que já conhece. E que busque sua candidata em casa’, conta Claudia, da A2. Nesses encontros, as moças temem causar uma impressão errada. Gastam horas escolhendo a roupa. O pânico deles é não gostar da candidata e ter de aturá-la até o fim do programa. Agências como a Paimi tentam eliminar a saia-justa. Antes de trocar números de telefone, os candidatos se encontram três vezes, numa sala reservada. Em outras, como a Lunch for Two, os psicólogos selecionam um par com boa chance de combinação e agendam um almoço. O homem e a mulher sabem que devem procurar uma mesa reservada pela agência, mas nem imaginam quem encontrarão lá. ‘O almoço no meio de um dia de trabalho é bem mais descontraído que um compromisso à noite’, explica a diretora Ioná Schechter.
Um estudo do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) revelou que, na faixa dos 30 aos 34 anos, há 11 mulheres para cada homem. Nas agências, as mulheres também são a maioria, mas não chega a dois por um. Quando a proporção se desequilibra demais, muitas fazem promoções especiais para atrair rapazes. É justamente na faixa dos 30 anos, com a carreira resolvida, que a vontade de ter um filho aumenta e a pressão biológica aperta. É o caso da administradora Márcia Cunha. Aos 32 anos ela quer casar e ser mãe. ‘Quando saio à noite, os homens aparecem, mas só querem sexo. Eu quero compromisso’, diz. ‘Já saí com três candidatos da agência. Ainda não rolou a química, mas encontrei pessoas com objetivos sérios.’
Os solteiros preferem agências por conta da segurança que não encontram na internet, por exemplo. Muito menos nas ruas. Alguns serviços levantam a ficha criminal dos clientes e conferem se têm nome m cartórios de cobrança. Os preços também promovem uma seleção natural. As taxas chegam a R$ 1.500 por um ano de serviço. ‘Quem faz esse investimento não está para brincadeiras’, acredita a dentista Claudia Della Nina, de 35 anos. ‘Antes de me formar tive um namorado de quem gostava muito, mas terminei a relação por medo de me envolver. Eu estudava muito e não queria que cobrasse tempo para namorar. Hoje percebo que desperdicei uma chance.’
A maioria dos solteiros esconde que preencheu uma ficha romântica por medo do preconceito. A artista plástica Helenice, de 31 anos, e o professor de química Alexandre Antunes, de 32, se conheceram por intermédio de uma agência. Ela era mais velha e mais alta do que ele sonhava, mas se apaixonaram e subiram ao altar. A irmã da noiva se recusou a comparecer ao casamento. Do time dos corajosos, o administrador José Fernando Roboton, de 55 anos, não liga para falatórios. Procurou a agência em que encontrou a atual namorada depois de sete anos de separação. Gostou tanto que indicou o serviço à ex-mulher.
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Fonte: http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT549251-1664-2,00.html